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SHOPPING DA GÁVEA

  • luizfeliperezende0
  • 3 de jan.
  • 3 min de leitura

O shopping é antigo: 1975 foi o ano da inauguração. Já teve a famosa boate: Frenetic Dancing Days funcionando em seu interior, antes da década de 1980. Foi para uma dançarina desta boate que Caetano compôs a canção Tigresa:


“...Enquanto os pelos dessa deusa tremem ao vento ateu

Ela me conta, sem certeza, tudo o que viveu

Que gostava de política em 1966

E hoje dança no Frenetic Dancing Days

……………………………………………...

As garras da felina me marcaram o coração

Mas as besteiras de menina que ela disse, não

E eu corri pra o violão num lamento, e a manhã nasceu azul

Como é bom poder tocar um instrumento”.


O shopping é um sobrevivente, um dinossauro dos shoppings no Brasil. O piso é antigo, talvez seja o original. Fica perto da sede do Flamengo, e não é à toa que vejo várias pessoas com a camisa do clube.


Abriga quatro teatros, estando em cartaz três peças populares sobre comédias de costumes; e tem também uma livraria especial com títulos raros e preciosos; e alguns cafés, além das lojas comuns dos shoppings. É um reduto de artistas, gente diferente que nunca vemos nos shoppings da Zona Norte, por exemplo. Essa tribo que sofre risco de extinção e está deslocada no tempo, frequenta e habita esse espaço. São atrizes, atores, roteiristas, cineastas, dramaturgos, escritores, tradutores…


Algumas atrizes já viveram sob as luzes da ribalta, já tiveram seus dias de glória, os nomes nos letreiros luminosos e fizeram parte do elenco no horário nobre da novela das 8 na Vênus Platinada. A Globo ficava na avenida Jardim Botânico que precede a Marquês de São Vicente onde se localiza o shopping, portanto relativamente perto. A emissora do Plim-plim era uma grande empregadora desses artistas e tinha muito mais poder sobre o país na época em que não havia internet.


Algumas das estrelas não reconheço. O tempo pode tê-las tornado anônimas. Fico curioso pra saber quem é. Belezas na alma, na elegância, na originalidade da veste que desfilam sobre o piso antigo do shopping. Pessoas que sobrevivem sem trabalho ou com trabalhos temporários, esporádicos. O mercado da Arte é volátil e volúvel.


E observo a senhora ruiva que se veste de vermelho bordô e saboreia uma torta de morango, sozinha na mesa da confeitaria, parece prolongar o seu prazer de degustação.


Dou algumas voltas e vou até aos teatros. E passa por mim, uma artista que me olha enquanto eu olhava os cartazes das peças. A artista vai em direção à escada, e aí reconheço que se trata de Carla Camurati. Se estivesse menos distraído, até poderia tietá-la e dizer que a admiro como no filme Cidade Oculta, atuando ao lado de Arrigo Barnabé que também fez a trilha sonora. E também gosto da sua direção arrojada no filme “Carlota Joaquina, Princesa do Brazil”, com a atriz Marieta Severo. Carla cumprimenta a moça do caixa do teatro, parecem ser amigas ou conhecidas.


Continuo a andar e percebo que a noite caiu fora do shopping. Surgem vários casais: meninas de mãos dadas com meninas, e meninos de mãos dadas com meninos. Passo novamente em frente à confeitaria. A senhora de vermelho bordô já saboreou a sua torta, ela se levanta e não a vejo pagando. Talvez tenha crédito na casa. Depois, ela caminha pelo corredor do shopping e percebo que manca para um dos lados. E assim com esses passos cambaleantes, vai em direção à saída para a rua, onde uma leve chuva fina cai e deixa os letreiros e as luzes mais brilhantes e translúcidas.


Luiz Felipe Rezende




 
 
 

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